O Brasil registra 11,9 milhões de pessoas desempregadas, das quais 497 mil no Pará, de acordo com dados do 1º trimestre de 2022 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. O desemprego acaba funcionando, então, como um agravante para 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade em trabalho infantil no país, em 2019, com 118.768 no Pará, como alertam profissionais que atuam na prevenção e combate a essa situação no Estado.
crise no emprego empurra crianças e jovens para trabalhos
informais (Ary Souza / Arquivo O Liberal)
Neste
domingo (12), quando transcorre o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil,
vale refletir sobre como crianças e adolescentes são desvirtuadas de sua
infância e juventude, deixando muitas vezes de lado os estudos e até a própria
dignidade para exercer ilegalmente atividades em cenários de risco em espaços
urbanos e rurais, sob pretexto de contribuir com o sustento de famílias.
Como
alerta para a gravidade da situação, a desembargadora do Tribunal Regional do
Trabalho da 8ª Região (TRT8), Maria Zuíla Lima Dutra, informa que, com base em
PNAD Contínua, do IBGE, em 2019 o Pará registrava 118.768 trabalhadores
infantis (crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade), o que corresponde a
5,8% do total de crianças e adolescentes do estado, acima da média nacional,
que era de 4,8% do total. Sobre a idade, 4,9% (5.865) tinham entre 5 e 9 anos
de idade; 19,1%(22.631) entre 10 e 13 anos; 33,6% (39.912) entre 14 e 15 anos e
42,4% (50.360) entre 16 e 17 anos de idade.
“Uma
triste constatação é de que 98,7% (89.092) dos trabalhadores infantis no Pará
desempenham atividades na informalidade, sem qualquer direito trabalhista.
Relevante destacar também que 84,2% (99.954) são negros e 59,2% (70.290)
residiam em zonas rurais”, pontua a magistrada. As principais atividades
exercidas por crianças e adolescentes trabalhadoras no Estado do Pará são:
comércio de produtos alimentícios, bebidas e fumo (12.103 ou 10,2%), produção
florestal (8.125 ou 6,8%) e serviços domésticos (7.972 ou 6,7%).
“São irmãos nossos que estão lutando para
sobreviver numa fase da vida em que deveriam apenas viver”, afirma a
desembargadora Maria Zuíla. “O mais triste é saber que esses números podem ser
sete vezes maiores do que os indicados nas estatísticas oficiais, com base em
um estudo divulgado recentemente pelos pesquisadores Sharon Wolf, da
Universidade da Pensilvânia, nos EEUU e o brasileiro Guilherme Lichand, da
Universidade de Zurique, na Suíça”, acrescenta.
Além
da criação do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil
(FNPETI) e dos programas de renda mínima, outro grande avanço foi a Lei da
Aprendizagem (nº 10.097/2000), referente à contratação de adolescentes e jovens
como aprendizes. “Infelizmente, o recente Decreto nº 11.061, de 04/05/2022,
promoveu profundas alterações na Lei da Aprendizagem (contratação de aprendizes) e ameaça 460 mil
contratos de aprendizagens hoje existentes no Brasil, na medida em que criou
mecanismos que mais beneficiam as empresas, como por exemplo, a permanência do
aprendiz na empresa como empregado, continua contando na quota de aprendizes; a
contratação de aprendiz em situação de vulnerabilidade social vale por duas
cotas; o aumento do prazo dos contratos de aprendizagem de 2 para 3 anos e
ainda existem casos em que o contrato pode chegar a 4 anos e outras situações
em que pode ser pactuado por prazo indeterminado (caso do portador de
deficiência) e assim por diante”, pontua a magistrada.
“Outro
aspecto negativo é o elevado número de desempregados no Brasil, o que nos leva
a projetar que o índice de trabalho infantil será elevado, porque a necessidade
de sobrevivência empurra crianças e adolescentes a trocarem a sua força de
trabalho por comida”, enfatiza a desembargadora Maria Zuíla. Para ela, o Brasil
precisa adotar a proteção de crianças e adolescentes como absoluta (acima de
todas as demais), investindo na educação e na conscientização dos cidadãos para
proteger crianças e adolescentes de toda forma de atuação. Segundo a
Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Fundo das Nações Unidas para
Infância (Unicef), em relatório de junho de 2021, o trabalho infantil atingiu
160 milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo.
Aumento
A
procuradora do Ministério Público do Trabalho, Rejane Alves, coordenadora
regional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do
Adolescente (Coordinfância), destaca que em 13 anos de atuação na área verifica
que o cenário atual do trabalho infantil no Brasil nunca foi tão adverso desde
ano 2000. Ela observa que até 2019, os casos mostravam-se em redução, mas em
2019 são contabilizadas 1,8 milhão crianças e adolescentes (5 a 17 anos) em
trabalho infantil. Rejane Alves destaca que hoje não se tem dados estatísticos
sobre o assunto no Brasil, em virtude da pandemia e da não realização do Censo
em 2020, mas “é possível a qualquer um de nós verificar um aumento nas ruas e
logradouros públicos o aumento da presença de crianças em situações de
trabalho”. Ela salienta que a crise na geração de empregos provoca a inserção
precoce de crianças e adolescentes, desprotegidas, no mundo do trabalho.
Fome
Vanilza
Malcher, juíza do Trabalho e gestora regional do Programa de Combate ao
Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do TRT8. Ela observa que, com a pandemia da covid-19,
“todas as mazelas sociais sofreram acréscimo em seus números, e a mais grave
delas é a fome”. A magistrada pontua que, segundo relatório 2022 da Rede Brasileira
de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN), 33,1 milhões de
pessoas passam fome no Brasil em 2022, retornando o país ao patamar do início
dos anos 1990. “Quando a fome aumenta, o trabalho infantil também aumenta, e
essa realidade é visível, bastando sair de casa e olhar para o lado, nas ruas,
nas esquinas e na frente de alguns estabelecimentos de nossa cidade. Tudo isso
é muito preocupante e triste”, enfatiza.
Desde
2014, o TRT8 desenvolve ações de conscientização das famílias e da sociedade
sobre os males do trabalho infantil. Nesse período, mais de 3 mil adolescentes
e jovens foram inseridos no Programa Nacional da Aprendizagem, entre outras
ações. A campanha do TRT8 terá um pelotão específico sobre o tema no Arrastão
do Arraial do Pavulagem, neste domingo.
Belém
De
acordo com o relatório da Fundação Papa João XXIII (Funpapa), de 2018 a 2022,
entre os anos de 2018 e 2021, foi verificado o aumento de 33,3% no total de
casos de trabalho infantil atendidos. "Considerando dados até o mês de
abril de 2022, houve registro de quase 200 ocorrências em cinco Centros de
Referências Especializados de Assistência Social (CREAS). A maior quantidade de
situações ocorreu na territorialidade do CREAS José Carlos Pacheco (94), o qual
atende bairros do Distrito de Icoaraci, Outeiro e ilhas próximas".
Outro
registro feito pela Funpapa é de que o ano de 2019 foi o que registrou maior
percentual de casos (32,4%), seguido por 2018, com 30,1%. Entre os cinco CREAS,
o Manoel Pignatário identificou a maioria dos casos (684). De 2018 até abril de
2022, foram registradas 1.801 situações desse tipo identificadas pela Funpapa.
Da Redação/Viva
Notícias
Fonte: O liberal
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