A Semana de Arte Moderna encheu o Theatro Municipal de obras que gritavam por liberdade entre 13 e 17 de fevereiro de 1922.
Semana de Arte Moderna de 22 reuniu, quadros, esculturas, projetos e apresentações de dança, música e poesia — Foto: Reprodução
A
semana sintetizou um processo de mais uma década de articulação de jovens
artistas que se inspiravam nos movimentos vanguardistas europeus para propor
uma arte livre, que rompesse com os padrões engessados e conservadores da época
em São Paulo.
Mas
ela passou bem longe de ser uma unanimidade, atraiu críticas de intelectuais e
artistas da época preocupados com os tais "ideais futuristas” importados,
e teve também treta interna no grupo diverso que idealizou o modernismo no
Brasil.
E,
mesmo anos depois, foi o empurrãozinho ou a inspiração de grandes artistas e
movimentos: Carlos Drummond de Andrade escreveu seu primeiro livro inspirado no
Modernismo; Zé Celso Martinez montou “O rei da vela”, peça de Oswald de Andrade
e marco no Teatro Oficina; e respingou no tropicalismo.
"Essa
semana é a grande festa que um grupo de artistas em São Paulo, a quem depois se
juntaram artistas do Rio. Eles já vinham, há alguns anos, tentando uma ruptura
com a arte tradicional no Brasil em toda a década de 1910. A proposta já estava
pronta em 1920. E em fevereiro de 22 foi a festa”, explica José di Nicola,
professor e pesquisador do modernismo no Brasil.
O
g1 conversou com o professor e também com o historiador Lucas de Nicola,
autores do livro “Semana de 22 - Antes do começo, depois do fim”, para entender
os bastidores e o legado do evento no país.
Tretas
internas e críticas públicas
Brigas,
divergências e polêmicas acompanharam o movimento desde sua concepção.
"O
termo futurismo era muito debatido em artigos da imprensa. Muita gente contra
esses jovens modernistas que fariam a semana. E o próprio futurismo era um
movimento que gerava controvérsia porque, desde o fim da primeira guerra
mundial, o Marinetti, criador do futurismo, se aproxima do Mussolini no momento
em que o fascismo estava surgindo na Itália. Então os modernistas se diziam
futuristas, mas não de Marinetti", conta José.
O
professor se refere a Filippo Tommaso Marinetti, escritor e poeta italiano e
autor do Manifesto Futurista.
Os
modernistas tiveram muitos críticos, entre eles estrelas da arte brasileira. O
escritor Monteiro Lobato, por exemplo, foi um dos mais eloquentes. Ele escrevia
artigos e não perdia a oportunidade de alfinetar o trabalho dos colegas. Em
1917, em crítica a uma exposição de Anita Malfatti, ele chegou a publicar que
as obras modernistas eram frutos de “cérebros transtornados por psicoses”.
Grandes
editores de jornais, que ditavam a opinião na época, também escreviam artigos
ridicularizando as formas das obras.
O
público que foi ao Theatro ver o futuro não gostou muito do que viu e ouviu e
grandes vaias eram ecoadas durante as apresentações.
Já
as brigas internas nasceram de todos os lados. Anita Malfatti foi criticada
dentro do grupo porque passou a fazer uma arte “menos inovadora”, Menotti del
Picchia se desentendeu com Mário de Andrade; Mario e Oswald encerraram a
amizade e a relação cortês; e até houve uma rixa entre Anitta e Tarsila do
Amaral.
Respingos
do furacão na arte brasileira
Tarsila
do Amaral, Carlos Drummond de Andrade, José Celso Martinez, Caetano e Gil são
alguns dos artistas que se inspiraram na Semana para ousarem em suas produções
artísticas.
Tarsila
foi a filha imediata da Semana. Ela vivia na França no começo de 1922, mas
retornou ao Brasil no meio do ano e conheceu, só aqui, a estética moderna.
"Até
aquele momento, ela tinha sido ligada à estética acadêmica. Foi por meio das
cartas com a Anita e da convivência com o grupo e Oswald de Andrade, que ela
começou a estudar cubismo e a produção das vanguardas. No final de 1923, ela
produz ‘A Negra’, ‘A Cuca’, obras com temática nacional”, conta Lucas.
“Carlos
Drummond de Andrade, na época da semana, era um jovem poeta ainda desconhecido
em Minas Gerais que também se sentia incomodado e tinha vontade de fazer suas
ousadias estéticas, mas não tinha coragem de divulgar pro mundo. Ele diz, em
cartas, que foi a partir das leituras, sobretudo do Mário de Andrade, que se
sentiu motivado a continuar ousando e publicar o que fazia”, explica o
historiador. Seu primeiro livro, “Alguma poesia”, é dedicado a Mário de Andrade.
Oswald
de Andrade também foi a fonte de inspiração de várias manifestações. “O
modernismo influenciou o Movimento da Poesia Concreta, nos anos 1950",
exemplifica José.
Uma
inspiração musical bem popular viria na década seguinte "O movimento
tropicalista tem uma nítida inspiração no Oswald de Andrade."
O
teatro também se alimentou do modernismo na mesma época. "Em 1967, Zé
Celso monta, no Teatro Oficina, ‘O Rei da Vela’. A peça foi escrita no início
da década de 1930. O peso e a montagem do Zé Celso abrem novas perspectivas
para a arte moderna no Brasil, foi uma montagem absolutamente revolucionária. O
texto do Oswald era revolucionário mais de 30 anos depois e esse foi um
espetáculo que marcou o Oficina”, explica José.
Os
tropicalistas, nos anos 1960, beberam do Manifesto Antropofágico, de Oswald, e
em seus conceitos de apropriação de manifestações culturais com elementos
nacionais, para criar o tropicalismo. Em um capítulo do seu livro "Verdade
tropical", Caetano Veloso conta que conheceu a obra de Oswald por meio de
"O rei da vela". Depois disso, foi estudar o legado dos modernistas e
a obra do escritor paulista.
Da Redação/Viva
Notícias
Fonte: g1
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