Há um ano, a vacinação contra o novo coronavírus iniciava no
Pará. 95% dos indígenas que tomaram a segunda dose ainda não tomou a dose de
reforço no estado.
Depois de um ano de vacinação contra Covid-19 no Pará, a liderança indígena Wendel Tembé conta que perdeu parentes para a Covid-19 e que ainda há entraves para a imunização de aldeias. Até então, 95% da população indígena no Pará vacinada com a segunda dose ainda não tomou a dose de reforço. "Pastores tentaram influenciar indígenas e chegaram a falar que a vacina era do demônio, que iríamos virar jacaré. Tivemos óbitos porque muitos tiveram medo de se vacinar".
Sobre a vacina, Wendel Tembé diz que a disseminação de
informações falsas pela internet, em afirmações do presidente Jair Bolsonaro e
por igrejas, causaram medo, mas que a imunização é essencial para vencer a
pandemia.
"Eu, como parte da liderança indígena Tembé, vejo que
nós, povos indígenas, temos que apostar e acreditar na medicina, porque o tempo
de vencer o inimigo com arco e flecha acabou. A vacina é a melhor saída para
nos livrar dessa enfermidade", diz.
No
Pará, segundo a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) a primeira
indígena vacinada foi Ronoré Kaprere Pahinti. Ela tomou todas as doses,
incluindo a de reforço.
A Sespa disse que realiza a distribuição para vacinação
de indígenas, mas "há Distritos Sanitários Indígenas enfrentando recusas à
vacina, motivadas por vários fatores como as falsas notícias sobre os
imunizantes".
Quanto à logística, a Sespa informou que "é complexa
e requer atenção diferenciada, e o governo do estado vem colaborando conforme
as demandas solicitadas pelos DSEIs".
Durante a pandemia, os Tembés da aldeia Tekohaw chegaram a
não registrar casos de Covid-19 em períodos de isolamento rigoroso.
"Tivemos
reuniões logo quando começou a pandemia. A gente não podia estar aglomerado,
mas aí o povo Tembé teve bom senso... Conversamos, tomamos os cuidados
possíveis, foram feitas várias aldeias improvisadas no meio da mata para não
ficarmos na margem do rio, expostos".
Mas a Covid chegou às aldeias. Wendel lembra que perdeu
dois parentes. Ambos tinham tomado apenas a 1ª dose da vacina.
Ele conta que um deles era um grande guerreiro,
referência na cultura indígena; o outro, que era cacique da aldeia Ita Putyr,
morreu com pouco mais de 70 anos e também era uma grande influência para o povo
Tembé. Na região de Marabá, onde ele cresceu, faleceu o cunhado, que era
cacique de uma aldeia. Ele tinha 40 anos de idade.
Wendel relata que lideranças foram atingidas porque andavam para fora das aldeias para reuniões em Belém. Ele mesmo contraiu duas vezes a doença, já que trabalha em cinco aldeias e sempre se movimenta para levar informação entre os grupos. A maioria já tomou a dose de reforço.
O indígena afirma que os óbitos são vistos, culturalmente, de uma forma diferente na tradição Tembé, e que a Covid-19 impactou diretamente no ritual de despedida:
"Quando morre um de nós, a gente tem, por cultura, que ficar oito dias ali no velório, com a família. Agora imagina morrer 2, 3 ao mesmo tempo. Como ia ficar nosso povo?".
A
vacina que chegou até as aldeias do Alto Rio Guamá levou mais confiança aos
indígenas, diz Wendel:
"A gente está mais confiante, se sente hoje mais
seguro. Pelo fato de já termos tomado as duas doses e o índice de casos já ter
diminuído. Os que surgiram depois da vacina foram casos mais fracos, as pessoas
sentem muito poucas dores, perto do que sentiam antes. A gente acredita que
após a terceira dose todo mundo vai se sentir melhor ainda".
"A gente perdeu muita coisa já. Está perdendo terra, língua, tradição... Então eu peço a todas as comunidades indígenas que se vacinem, que aceitem a vacina", ele conclui.
Da Redação: Viva Notícias
Fonte: G1 Pará
Nenhum comentário
Postar um comentário