A notícia da crise no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) – órgão que produz e coordena o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) – veio duas semanas antes da prova. Mais de 30 funcionários entregaram seus cargos, alegando fragilidade técnica e administrativa contra a atual gestão.
Servidores do Inep detalham interferência no conteúdo das provas do Enem — Foto: Reprodução/Fantástico
"Grande
erro é achar que você pode simplesmente pegar uma prova e sair riscando itens
que você não gosta do conteúdo deles", diz um servidor, que afirma que
existe uma "pressão insuportável". "O corpo técnico e pedagógico
se vê obrigado a refazer a prova duas vezes", comenta um outro
funcionário. Um terceiro servidor afirma: "Isso é um assédio moral."
A
prova do Enem é elaborada todos os anos com 180 questões. Todas as perguntas
são retiradas do Banco Nacional de Itens, formado por milhares de questões
redigidas por professores escolhidos por edital. A equipe técnica do Inep
escolhe as 180 questões com nível de dificuldade adequado a cada edição anual do
exame. O processo de criação da prova acontece em um espaço chamado “ambiente
seguro”.
“Eles
têm níveis de segurança. Você tem que passar por um daqueles scanners de corpo.
Qualquer objeto de metal que estiver com você vai ser detectado. E você não
pode entrar com ele. As portas são altamente seguras. A montagem da prova, você
faz em um nível de segurança, todo cercado de câmeras. Não tem nenhum ponto
cego dentro desse ambiente”, detalha um servidor.
Só
que os servidores reclamam que, no dia 2 de setembro – no período em que a prova
do Enem estava em fase final de elaboração – um policial federal passou por
todo esse esquema e entrou no ambiente seguro.
“O
Inep precisa explicar como essa pessoa foi parar lá dentro, quem autorizou a
entrada, o que ele fez, que nível de controle a gente tem das informações que
ele acessou lá”, questiona o servidor.
"A
gente não consegue imaginar outro esforço ou motivação que não seja intimidar
servidores", comenta um outro funcionário.
Censura
Os
servidores também relatam censura às questões dos exames. O diretor designado
para fazer esse trabalho de leitura dos itens é o diretor de avaliação da
educação básica. Quem ocupa esse cargo é Anderson Oliveira.
"Esse
dirigente designado pelo presidente do Inep, Danilo Dupas, foi até o ambiente
seguro, fez a leitura das questões que essa equipe técnica havia montado, essa
primeira prova do Enem, e solicitou a exclusão de mais de duas dezenas de
questões dessa primeira versão da prova", conta um servidor.
Segundo
ele, são questões que tratam de conhecimentos do contexto sociopolítico e
socioeconômico do Brasil. "Eram questões que tratavam principalmente da
história recente do país, dos últimos 50 anos. Sob o ponto de vista da equipe
técnica, não havia qualquer reparo pedagógico a ser feito na primeira versão da
prova", afirma um servidor.
Foi
a partir desta situação tensa que os servidores se viram obrigados a elaborar
uma segunda versão da prova do Enem. "Mas sem utilizar aqueles itens que
foram objeto de exclusão, a prova baixava a nota máxima possível. Enfraqueceria
fortemente a capacidade da prova do Enem", explica o servidor. "E
isso foi objeto de um terceiro movimento, de se fazer uma terceira versão de
prova".
Nessa
terceira versão, alguns itens que haviam sido retirados da primeira prova
voltaram para equilibrar o grau de dificuldade do Enem.
"O
Inep sempre foi dirigido por pessoas que tinham alguma trajetória acadêmica, esse
presidente que está agora é uma pessoa sem currículo, sem experiência, está lá
porque o ministro da Educação decidiu que seria a pessoa que estaria disposto a
fazer o que eles queriam: entrar na prova e retirar aquilo que eles acham que o
presidente não iria gostar”, diz o servidor, referindo-se ao presidente Jair
Bolsonaro, que já havia criticado algumas questões de provas anteriores.
Depois
do pedido coletivo de exoneração de cargos, o presidente do Inep, Danilo Dupas,
foi convocado na comissão de educação da Câmara dos Deputados para dar
explicações, mas disse que gostaria de tratar internamente a questão.
A
prova do Enem é no próximo domingo (21). Dupas afirmou que ela está garantida.
Os servidores confirmam.
“Essa
prova, à custa da saúde mental de vários colegas servidores, consegue ainda
atender aos seus objetivos”, diz um dos exonerados.
Da Redação/Viva
Notícias
Fonte: g1
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